quinta-feira, 26 de maio de 2011

Adoração, Louvor e Entretenimento



Para melhor compreender a condição da igreja evangélica brasileira hoje, uma análise da forma como é concebida a adoração e o louvor podem trazer luz, visto que o seguimento da música gospel cada dia cresce e floresce até mesmo nos mais variados ramos da sociedade. Dentro da própria igreja, se confunde louvor com música e adoração com shows gospels. Caminhando nesse sentido, a igreja brasileira fornece ao público leigo em matéria de Evangelho uma fotografia distorcida e embaçada da essência cristã.

E no quesito entretenimento dentro da igreja, com inovações e modismos, a prática cristã atual cada vez mais se assemelha à parques de diversões e jogos de entretenimento. Ao discorrer sobre esse tema, Philip Yancey concluiu: “A igreja existe, não para oferecer entretenimento, encorajar vulnerabilidade, melhorar auto-estima ou facilitar amizades, mas para adorar a Deus. Se falharmos nisso, a igreja fracassa”.1

Sobre este assunto, quero compartilhar o que compreendo ser a verdadeira adoração que Jesus ensinou à samaritana.

ADORAÇÃO

O tema adoração nos faz lembrar o diálogo de Jesus com a samaritana (Jo 4). Gosto de chamar a atenção nesse diálogo para as palavras de Jesus em resposta à mulher: “crê-me que a hora vem, em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai”. Antes, a samaritana havia argumentado: “Nossos pais adoraram neste monte, e vós dizeis que é em Jerusalém o lugar onde se deve adorar.” (vers. 20 e 21).

Jesus estava respondendo à altura do que ela havia proposto, ou seja, um lugar certo para a adoração. Um modelo certo, um ambiente, um contexto, um ritual. A adoração a Deus estava sendo reduzida ao mero cerimonialismo.

Mas, afinal de contas, o que é adoração? Talvez muitas respostas venham a nossa mente diante dessa pergunta. Mas vamos aprofundar o conceito, pensando em algo além de respeito, veneração ou culto. Por que, para adorar a Deus, eu preciso levantar as mãos? E por que tenho que me ajoelhar? Ou ficar em pé? Por que tem que ser na igreja? Ou no contexto de um culto? Com que roupa devo adorar? E a música? Qual estilo, qual ritmo? Quais instrumentos? Em que denominação evangélica? E por que evangélica? Não é possível adorar num ambiente católico?

Jesus respondeu todas essas perguntas, e outras mais, quando disse: “crê-me que a hora vem, em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai”. A adoração a Deus não pode ser compreendida a partir de gestos, nem da forma como se encontra nosso corpo, se em pé, sentado ou com as mãos levantadas. Para adorá-lO não é preciso ajoelhar-se, ou se ver numa liturgia. Não importa se os homens estão de terno e gravata, ou de jeans e camiseta. Na verdade, não importa se a vestimenta é um calção ou bermuda, a mesma que se usa para jogar futebol. E também não se adora a Deus pensando em seguimentos religiosos. Qual a garantia que tenho, de que aquela beata ecumênica não adora a Deus em sinceridade?

Quem disse que a valsa e a guarânia são os ritmos adequados para adorá-lo? E desde quando eu preciso de música para fazê-lo?

George R. Foster, prefaciando o livro Por que tarda o Pleno Avivamento, de Leonard Havenhill, coloca: “Para ele, a questão não é se tocamos bateria em nossos templos ou se levantamos as mãos no culto de louvor”. E Havenhill finaliza seu prefácio sugerindo: “Que nós possamos viver sempre com os valores eternos em vista!”.2 Era para esses valores eternos que Jesus estava guiando aquela mulher. Imersos em conceitos distantes da aproximação que se deve ter com o Criador, judeus e samaritanos confundiam a vontade de Deus com rituais, até que O Messias aparece para esclarecer: não é em Jerusalém, não é neste monte, não é com este gesto, não é com esta roupa, não é com este rítmo, não é com esta liturgia, não é nesses ambientes, não é criando esses ambientes... É em espírito e em verdade. A verdadeira adoração a Deus acontece como estilo de vida.

Em tempo:
Há estilos musicais que enfatizam exageradamente a sensualidade e a carnalidade. E estes não são próprios para receberem letras que conclamam a adoração a Deus, tendo em vista que a adoração é algo que fazemos em nosso espírito, no âmbito espiritual. Um cristão autêntico não realça a carne.

Cláudio Ananias

Referências:

1 YANCEY, Philip. Igreja: Por Que me Importar, pag. 25. Apud Revista Ultimato, julho-agosto, 2005.

2 HAVENHILL, Leonard. Por que tarda o Pleno Avivamento. Belo Horizonte: Editora Betânia, 1989.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Declaração do dízimo, “indulgência” para títulos eclesiásticos?



A igreja evangélica no Brasil cresceu dando ênfase a evangelização e o ensino da Palavra de Deus. Este crescimento acelerou-se a partir de 1910, com a chegada do Pentecostalismo, trazido por alguns irmãos que haviam experimentado a chama do Movimento Pentecostal, dentre os quais cito Daniel Berg e Gunnar Vingren, fundadores das Assembleias de Deus no Brasil.

Ao olhar para o início desse movimento, vemos de fato um destaque na obra de evangelização. Cada crente tinha prazer em compartilhar sua fé, em sair para as ruas anunciando a mensagem do evangelho, de porta em porta, entregando folhetos, realizando cultos ao ar livre na casa de algum irmão, além do evangelismo nos trens, nos ônibus, nas praças e no próprio templo com a extinta “boca de ferro”, um aparelho que amplificava o som levando a mensagem às residências mais distantes. E o resultado era rápido, pois muitas pessoas se convertiam, apesar das perseguições enfrentadas por parte do catolicismo romano radical, especialmente no interior do estado, nas primeiras décadas do evangelismo pentecostal.

E a medida que os trabalhos iam se desenvolvendo, alguns modelos de liturgia iam sendo implantados, tais como o cântico congregacional (a edição da harpa cristã como hinário oficial ajudou na difusão e prática desse modelo), a leitura bíblica oficial, a pregação, a implantação de conjuntos (uma marca das ADs são os ‘conjuntos’ de mocidade, de senhoras, infantil, etc, que cantam sempre nos cultos) e o recolhimento de dízimos e ofertas, dentre outras atividades litúrgicas.

O lema desse movimento sempre foi: Jesus Cristo salva, cura, batiza com Espírito Santo e em breve voltará.

Mas, de um tempo pra cá, talvez pela influência do neopentecostalismo, temos presenciado a mudança de foco. As igrejas tendem a ser mais estruturadas fisicamente buscando um melhor conforto para seus membros, e isso tem levado alguns líderes à busca exagerada pelo requinte e ostentação. Sem falar nos salários pagos aos pastores e membros de diretorias. Se pegarmos uma planilha de gastos, coisa muito difícil de se conseguir em algumas administrações, vamos ver, por exemplo, que a obra de evangelismo e missões não tem primazia nos investimentos da igreja atual.

Como se isto não bastasse, essas mudanças estão sendo refletidas nas práticas litúrgicas e também nos deveres que são impostos aos membros das denominações. Sabemos que o dízimo e as ofertas alçadas é uma doutrina bíblica praticada pelos assembleianos e outras denominações de forma livre, de acordo com a fé e a consciência que cada crente tem da necessidade de ser participante na construção desse seguimento religioso. Sem que seja necessária a imposição, a declaração de dizimista, como obrigação para ser membro. Se assim fosse, teríamos a volta das indulgências, com outra roupagem, pois as indulgências tinham como objetivo conceder perdão, atenuar a gravidade de uma falta, ou remir os pecados dos fiéis da igreja.

E a Assembleia de Deus, que este ano comemora seu centenário, não precisou dar ênfase à doutrina dos dízimos e ofertas, não precisou instituir declaração de dízimo, pois ela cresceu e se desenvolveu com as contribuições financeiras de seus membros que acreditavam no trabalho e o faziam com amor e dedicação. Mas...



Existem convenções locais que colocam a declaração de dízimo como uma das prerrogativas para a consagração ao diaconato, presbitério e ministro (evangelistas e pastores). E essa prerrogativa, em algumas análises, fica acima de qualidades morais como: bom testemunho, conhecimento bíblico, preparo teológico e espírito de liderança. É como se as condições colocadas pelo colegiado apostólico, em Atos 6, não fossem suficientes, “boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria”.
Por exemplo, no estatuto da IEADERN, o candidato ao diaconato deve “ser fiel, comprovadamente, nas contribuições para a igreja” (Art 53) além de outros requisitos apresentados.

Em outras palavras, se o candidato cumprir com todas as condições: ter vocação divina para o diaconato; ser batizado com o Espírito Santo, ter conhecimento das Sagradas Escrituras, ser obediente à doutrina e aos usos e costumes da IEADERN, ter testemunho pautado nos princípios das Sagradas Escrituras; ter, no mínimo, três anos como auxiliar de trabalho” e não apresentar pelo menos 6 (seis) comprovantes de declaração de dízimo, não pode ser consagrado.

Minha análise é, será que não estamos mudando o foco? Será que não estamos nos distanciando do real objetivo da igreja?

Acredito na doutrina bíblica do dízimo, ensino e pratico sob a ótica da generosidade. Entretanto, nunca declarei, e não creio ser correto exigir declaração, como se fosse confissão de fé, ou profissão de fé.

Infelizmente nosso Centenário está marcado por pretensões econômicas, pretensões financeiras que embotam a ênfase missionária e evangelística dos primeiros dias pentecostais.

Em Cristo,
Cláudio Ananias